25 fevereiro 2007

Joalharia da Catalunha dos anos 30 aos anos 50

O final dos anos 20 e o início dos anos 30 foram uma época de grande vitalidade para os ofícios e criações de joalharia da Catalunha, que através de entidades artísticas como a FAD (Foment de les Arts I del Disseny) viram o seu trabalho reconhecido.
Com a Exposição Internacional de Barcelona em 1929, a cidade viu o seu protagonismo internacional crescer.
É pois a partir desta época que a arte catalã tem o seu ponto de viragem, renunciando assim ao seu aspecto tradicionalista e populista, para iniciar uma linha mais moderna, dominada pela reação contra o decorativismo fácil iniciado nos anos anteriores. Apesar da decadência própria do franquismo e de uma certa evocação renascentista carregada de maneirismos e que se traduziu em jóias carregadas de ostentação.

A joalharia vê então, o seu impulso apartir dos anos 30 com duas importantes figuras ligadas às artes, Alfons Serrahima e Manuel Capdevila.
Alfons Serrahima, foi um inovador na área da joalharia, dedicou-se não só à execução de jóias mas também ao seu desenho; sem radicalismo, impôs uma linha moderna dominada pelo gosto delicado, austero das formas e que reaccionou o gosto decorativo imposto nos anos anteriores pela Arte Déco e que dominava a joalharia barcelonina.
Criou formas sem ornamento, puras e com o engenho do desenho, o que na altura era bastante inovador, tendo sido esta uma das modestas exigências no campo dos ofícios e que acompanhou o desenvolvimento internacional nesta área.
No contexto da decadência estética dominada pelos anos do pós-guerra, Alfons Serrahima defende sempre uma linha de purismo formal, na clara utilização de materiais, longe da ostentação dos novos-ricos da época.
Serrahima representa sobretudo inovação na jóia moderna concebida com critérios de desenho e uma clara vocação artística.
A partir dos anos cinquenta dedica parte da e sua obra aos troféus e à medalhistíca desportiva. Outro dos campos explorados por Serrahima foi a ourivesaria religiosa, como o desenho de custódias, tendo realizado a coroa da Virgem de la Mercé, patrona de Barcelona, e um trono para a Virgem de Monserrat.
Serrahima trabalhou livremente sem causa para a tradição, oferecendo sempre novidades, a um nível em que a realidade se abstrai em símbolos e se organiza em formas puras.
Se o vanguardismo de Serrahima nasce da exigência do ofício e da sua honestidade profissional, outros representaram a variedade das correntes internacionais.

Alfons Serrahima

De espírito mais vanguardista é a obra de Manuel Capdevila, que integra o mundo da joalharia com toda a plasticidade das formas orgânicas da escultura europeia, seguindo a linha de trabalho de Hans Arp (escultura) e Joan Miró (pintura).
Capdevila, provinha de uma geração de artistas que formularam uma poética e uma linguagem impressas na sociedade catalã.
Os artistas desta época entendiam que a joalharia deveria compreender um tratamento tão livre e contundente como as formas exploradas por Joan Miró.
Com a Guerra Civil espanhola (1936-39) instala-se em Paris, o que o dota de um talento especial para as experiências na escultura, quanto a matérias e técnicas e que tem influência no modo como trabalha as jóias.
Algumas das jóias realizadas por Capdevila e que remontam ao final dos anos quarenta, são caracterizadas por formas livres, criativas e inovadoras, ligadas ao surto do surrealismo, criando assim um caminho de crescente liberdade criativa, no uso de materiais, técnicas e formas.
A sua forma livre e criativa de trabalhar culminou na realização da “Coroa para um Mártir” (1954) feita em couro, ferro e pedras de diferentes tonalidades, que demonstram coesão formal e a contundência expressiva das suas peças.
O modo como Capdevila marcou a joalharia do pós-guerra veio a confiar-lhe nos anos 50 o grau de mestre na Escola Massana, foi neste escola que germinou a renovação da joalharia que uma geração mais tarde ficou conotada com a joalharia de autor.
A jóia passou então a ser considerada um objecto de expressão artística oposto à produção em série; peças únicas, que servem a arte. “Qualquer que seja o material, a pedra e tudo o que existe pode ser uma matéria nobre, tudo depende do gosto e da sensibilidade artística dos que se interessam pela obra.” – Manuel Capdevila.
A sua obra ficou marcada por dois factores significativos, a afirmação do seu trabalho enquanto trabalho de equipa e a influência decisiva do uso de materiais não preciosos como o ferro e as pedras, que demonstram uma aproximação ao usuário.
O seu trabalho esteve ligado à renovação das técnicas e materiais de um ofício que servia a arte, ligando assim a produção de jóias à vanguarda, como sendo o uso de colagens, objectos e a criação de construções portáteis.
Para Capdevila a realização de uma jóia consiste na harmonização dos componentes artísticos, materiais e técnicas.

Manuel Capdevila


Prata e Laca japonesa, Manuel Capdevila


Prata e Laca japonesa, Manuel Capdevila


Prata, Ouro e Laca japonesa, Manuel Capdevila

Nos anos imediatamente a seguir à guerra, a joalharia mostrou o desejo de moderar as formas modernas com o prestígio das formas históricas.
Jaume Mercadé que inicia o seu trabalho ainda antes da guerra e que segue o programa novcentista internacional, com uma joalharia profusa de pedras e colorista, após a guerra acaba por seguir uma linha mais organicista, com formas arredondadas, fios metálicos e placas, que recordam não só a simplicidade plástica do escultor Hans Arp, mas também do escultor Alexander Calder.
Alexander Calder, escultor, produz algumas peças de joalharia que se destacam pela sua mobilidade, tal como as suas esculturas.

Ramon Sunyer, que provinha de uma família de joalheiros, foi um renovador na arte de fazer jóias, utilizou sobretudo o cinzelado, conjugando os diferentes matizes de metais preciosos com as tonalidades brilhantes das gemas e esmaltes. O seu trabalho internacionalizou-se com a Trienal de Milão em 1936. Algumas das suas jóias assemelham-se a obras da escultura Barbara Hepwoth, pelas formas abstractas usadas.
Joan Masriera, joalheiro da prestigiada e centenária Casa Masriera, inicia uma etapa de joalharia monumental com o uso de esmaltes translúcidos e cristais gravados, em que as formas arcaicas estilizadas e os elementos mecanicistas fazem lembrar o apogeu da Arte Nova.

Ramon Sunyer

O informalismo pictórico que penetrou na Catalunha através da obra de Antoni Tàpies por volta de 1955, deixou impressa no campo da joalharia uma profunda renovação. Este contou com a colaboração de Manuel Feliu Via que produziu várias jóias com materias considerados pobres, como pedras.
A joalharia deixou então, de ser arte uma arte menor ou aplicada, para passar a ser uma arte de primeira necesidade, menos decorativa e sumptuária, passou a ser mais artística e antropológica, sem menosprezo para o rigor do ofício. As jóias passaram a ser fruto de uma plástica sensorial, e um símbolo de cada circunstância histórica.

Sem comentários: